24.10.13

manifesto queer nation [parte i]

parte 1 de 4 da tradução de um manifesto originalmente posto a circular entre pessoas que marchavam com o contingente ACT UP da marcha do orgulho gay de Nova Iorque, em Junho de 1990. autoria(s) anónima(s). texto original aqui & mais informação sobre a ACT UP aqui.



Como to posso dizer? Como te posso convencer, irmão, irmã, que a tua vida está em perigo? Que todos os dias em que acordas viv*, relativamente feliz e um ser humano funcional, estás a cometer um acto de rebelião? Enquanto queer viv* e funcional, tu és um* revolucionári*. Não há nada neste planeta que valide, proteja ou encoraje a tua existência. É um milagre que estejas aqui a ler estas palavras. Devias estar mort*.

Não te deixes enganar, as pessoas hetero têm posse sobre o mundo e o único motivo pelo qual foste poupad* é por seres espert*, sortud*, ou um* lutador*. As pessoas hetero têm um privilégio que lhes permite fazer tudo o que queiram e foder sem medo. Mas elas não se limitam a viver uma vida livre de medo; elas ostentam a sua liberdade na minha cara. As suas imagens estão na minha TV, na revista que comprei, no restaurante em que quero comer e nas rua onde moro. Quero que haja uma moratória sobre o casamento hetero, sobre os bebés, sobre demonstrações públicas de afecto entre membros dos diferentes sexos e sobre imagens mediáticas que promovam a heterossexualidade. Até que eu possa viver a mesma liberdade de movimento e sexualidade, enquanto heteros, o seu privilégio tem de ser impedido e cedido a mim e às minhas irmãs e irmãos queer.

As pessoas hetero não farão isto voluntariamente e por isso terão de ser forçadas a fazê-lo. Os heteros têm de ser atemorizados ao ponto de o fazer. Aterrorizados ao ponto de o fazer. O medo é a mais poderosa das motivações. Ninguém nos dará o que merecemos. Os direitos não são dados, são tomados, se necessário pela força.

É mais fácil lutar quando se sabe quem é o inimigo. As pessoas hetero são o inimigo. Elas são o teu inimigo quando não reconhecem a tua invisibilidade e continuam a viver em e a contribuir para uma cultura que te mata.

Todos os dias, um de nós é tomado pelo inimigo. Quer seja uma morte relacionada com a SIDA devido à inactividade governamental homofóbica ou um ataque a lésbicas num restaurante aberto à noite (num bairro supostamente lésbico), estamos a ser sistematicamente despachad*s e continuaremos a ser arrasad*s a não ser que nos apercebamos que se levam um* de nós têm de nos levar a tod*s.

1. Um Exército de Amantes Não Pode Perder

Ser queer não é sobre um direito à privacidade; é sobre a liberdade de ser públic*, de simplesmente sermos quem somos. Significa lutar diariamente contra a opressão; a homofobia, o racismo, a misoginia, a intolerância de hipócritas religiosos e o teu próprio ódio a ti mesm*. (Fomos cuidadosamente ensinad*s a nos odiar a nós própri*s.) E agora, claro, isso significa também combater um vírus e todos os que odeiam paneleiros que estão a usar a SIDA para nos aniquilar da face da terra.

Ser queer significa levar um tipo diferente de vida. Não é sobre o mainstream, margens de lucro, patriotismo, patriarcado ou ser assimilad*. Não é sobre directores executivos, privilégio e elitismo. É sobre estar nas margens, definindo-nos a nós própri*s; é sobre rebentar com o género e é sobre segredos, o que está debaixo do cinto e bem fundo dentro do coração; é sobre a noite. Ser queer é “grass roots” porque sabemos que tod*s nós, cada corpo, cada cona, cada coração e cú e pixa, é um mundo de prazer à espera de ser explorado. Cada um* de nós é um mundo de possibilidades infinitas.

Somos um exército porque temos de ser. Somos um exército porque somos tão poderosos. (Temos tanto pelo que lutar; somos a mais preciosa das espécies em vias de extinção.) E somos um exército de amantes porque somos nós que sabemos o que o amor é. E o desejo e a excitação, também. Nós inventámo-los. Nós saímos do armário, deparamo-nos com a rejeição social, confrontando pelotões de fuzilamento, apenas para nos amarmos uns/umas aos/às outr*s! Sempre que fodemos, ganhamos.

Temos de lutar por nós própri*s (mais ninguém o vai fazer) e se nesse processo trouxermos maior liberdade ao mundo em geral, então óptimo. (Já demos tanto a este mundo: a democracia, todas as artes, os conceitos de amor, filosofia e alma, para nomear apenas algumas das dádivas das nossas anciãs Bichas e Fufas Gregas.) Façamos de todo o espaço um espaço Lésbico e Gay. De todas as ruas uma parte da nossa geografia sexual. Uma cidade de ânsia e depois, de total satisfação. Uma cidade e um país onde possamos estar segur*s e ser livres e ainda mais. Temos de olhar para as nossas vidas e ver o que é melhor nelas, ver o que é queer e o que é hetero, separar o trigo do joio! Lembrem-se que nos resta tão, mas tão pouco tempo. E eu quero ser amante de cada um* de vocês. No ano que vem, marchamos nu*s.


-- Queer Nation, 1990


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